quinta-feira, 31 de julho de 2008

Bossa Nova em Sampa

"A casa da bossa é a Oca", afirma o videomaker Carlos Nader, que divide a curadoria da exposição Bossa na Oca com Marcello Dantas. Nader tem razão. Hoje me senti orgulhosa por ver Sampa tomada de bossa. Estive na OCA, no Parque do Ibirapuera, onde até 07 de setembro acontece uma super exposição para homenagear os 50 anos da Bossa Nova. Fiquei encantada. Logo na entrada o visitante acompanha uma linha do tempo com fatos que marcaram o Brasil e o mundo de 1958 até 1964. É um apanhado geral fabuloso, com fotos lindíssimas. A partir daí, a mostra inclui muito mais que ver ou ouvir. É hora de começar a sentir. Seis "jukeboxes" gigantes, ativadas com o calor da mão, possibilitam que o visitante escolha as canções que quiser ouvir, todas em vinil, com as gravações originais. No subsolo, uma surpresa maravilhosa: a reprodução da Praia de Copacabana, com areia e o clássico calçadão preto-e-branco de pedras portuguesas (em formato semicircular). Essa montagem ocupa cerca de 800 m2 do subsolo da Oca. Uma iluminação feita nas paredes simula a passagem do dia para a noite. Nada mais perfeito, afinal, Bossa Nova de verdade acontece à beira mar. Ainda no subsolo encontra-se também um palco real, com piano, banquinho e até copo de uísque para Vinícius. O espaço representa o Beco das Garrafas, o famoso templo da Bossa Nova. Imagens holográficas de músicos como Ella Fitzgerald e Frank Sinatra dão um toque especial e a cada 15 minutos eles executam juntos "Garota de Ipanema", graças à tecnologia eyeliner. Magnífico! No primeiro andar, encantamento total! É possível assistir a três curtas sobre os maiores representantes da Bossa Nova em espaços decorados com muita imaginação, bom gosto e conforto. Numa das salas é exibido o curta inédito de Miguel Faria Jr, "Vinícius de Moraes", com dez minutos de duração. O filme é projetado numa parede semi-convexa do museu e foi criado especialmente para a a exposição. O som sai de luminárias, dispostas ao lado de 30 poltronas bem confortáveis. Em outras salas é possível assistir aos filmes até deitado, em puffs muito fofos. Ou acompanhar a história em banquinhos de piano, com partituras e tudo. Ali é possível também viver a experiência do silêncio, entrando por alguns segundos numa câmara anecóica, onde dá pra ouvir até as batidas do próprio coração. No último andar você literalmente viaja com uma projeção enorme e maravilhosa do mar no teto, enquanto ouve clássicos da Bossa Nova. Você se sente voando sobre o mar. É uma poesia materializada diante dos seus olhos. Lindo demais! Por mim, tudo perfeito, não fosse apenas pelo fato de que a interação com muitos espaços, às vezes, prejudica o perfeito entendimento do som. Imagino que num dia de maior público isso possa ser frustrante. Enfim, essa é uma homenagem mais que merecida e à altura do espetacular movimento musical criado por mentes geniais, que marcou eternamente a cultura brasileira e ganhou o mundo. Vale a pena conferir.

quarta-feira, 23 de julho de 2008

Afeto com prazo de validade

Antes de começar a postagem de hoje, me antecipo em pedir desculpas pela falta de elegância no parágrafo a seguir. É que o tema me obriga a deixar o "rapapé" pra lá. Deixo claro também que esse post não tem endereço certo. No entanto, se a carapuça for do seu número, vista e faça bom proveito. Procure com isso reavaliar suas ações e tornar-se mais digno da consideração e do afeto que lhes foram dispensados inutilmente.

Não existe ditado mais otimista do que esse: "Até um pé na bunda te faz andar em frente". Dureza é se inserir nesse contexto entrando com a bunda. Alívio é saber que mesmo com a bunda (e a alma) dolorida, quem vai pra frente é você. Quem deu o pé, certamente vai ficar paradinho, sempre no mesmo lugar, só observando.

Minha acidez se explica: ultimamente tenho visto com freqüência estarrecedora muita gente decepcionada com relacionamentos de toda espécie. A mágoa, em geral, chega via Internet e deve-se ao sumiço repentino de supostos namorados ou amigos, bloqueios, exclusões, rejeições veladas...

A gente não se dá conta, mas a Internet inaugurou um sentido mais amplo para a vida e, por isso mesmo, mais complexo. Hoje vivemos o que é chamado de simultaneidade dinâmica no seu aspecto mais real. Só que pra entender esse processo e usufruir bem dele é necessário ter a mente aberta e estar convicto de que a vida virtual acontece no paralelo, mas em algumas ocasiões se conecta à vida real. Daí que sexo, namoro, amizade ou qualquer outra espécie de interação na virtualidade tem a mesma intensidade e gera iguais possibilidades que na vida real. E daí também é que o sofrimento com uma perda é verdadeiro, dói intensamente e deixa marcas, senão eternas, pelo menos durante um bom tempo.

A triste conseqüência disso é o surgimento de um ceticismo tamanho, que diante de novas possibilidades você já enxerga o pacote completo: brigas, desconfiança, ciúme, dificuldades de conciliar o relacionamento com a vida cotidiana, alterações de humor, dependência emocional e por aí afora. Um recolhimento começa a ser vislumbrado com prazer, afinal a vida é tão mais tranqüila sem tudo isso!

O mais engraçado é que todas as histórias que tenho ouvido são compostas pelos mesmos ingredientes. No início a empolgação não impõe limites pra nada. A disponibilidade do outro é total. Troca de olhares apaixonados, mil mensagens, telefonemas, encontros e promessas de um final feliz (que aliás nem passou pela sua cabeça e você recebe até com uma certa estranheza): casamento, filhos, casinha no campo e um monte de labradores... Depois de pouquíssimas noites de sono, a mudança é radical. O tempo torna-se escasso, milhões de impedimentos começam a surgir, a comunicação vai ficando rara. Isso, é óbvio, quando você está sendo cozido em fogo brando. Há casos, porém, em que a interrupção é brusca e o sumiço total acontece do nada.

O fato inequívoco, no entanto, é uma constatação cruel: em qualquer caso, o prazo de validade venceu. Nem tente entender porque. O problema necessariamente não é você. Isso fatalmente acontece porque o encantamento proporcionado pela conquista consumada simplesmente acabou. E não adianta tentar me convencer do contrário, porque quem se importa com a outra pessoa age com honestidade e correção, chova ou faça sol.

Se você parar por um instante e refletir bem, vai perceber que convenientemente desconsiderou sinais que indicavam a falta de futuro na relação e permitiu que o desgaste se instalasse à sua revelia. Isso, no entanto, jamais justifica a postura covarde de quem não assume o desinteresse. É tão mais simples dizer a verdade, afinal, ninguém é obrigado a conviver com quem não quer e de maneira que não lhe agrada. Pior ainda é quando esse comportamento lamentável parte de homens ou mulheres supostamente maduros, dos quais se espera naturalmente uma habilidade mínima em lidar com questões delicadas.

De fato, como Jean-Paul Sartre sabiamente predisse, o inferno são os outros. Quem sabe a fórmula de se relacionar de acordo com o que dá na veneta, conforme determinadas pessoas fazem, não seja a ideal? Seria interessante viver uma vida onde ninguém, absolutamente ninguém, poderia se relacionar comigo quando eu não quisesse. Seria impossível alguém infernizar minha vida, a não ser que lhe entregasse uma senha e, mais importante, pudesse desligá-lo da tela quando bem entendesse. É, seria legal... Mas não seria humano.

Diante disso, acredito que há apenas dois caminhos a serem seguidos, ambos, porém, igualmente sofridos:

. Continuar investindo na relação, que dependendo do esforço empregado por você, pode até ser restabelecida. Só que fatalmente não será mais a mesma em função da mágoa anteriormente vivida e você ficará na eterna e inevitável perspectiva de voltar a passar pela mesma decepção a qualquer instante. Em resumo, muito prazer (será?) e nenhum sossego (com certeza!);

. Contrariar temporariamente seus desejos e encerrar essa etapa, pensando em novas possibilidades, se relacionando com outras pessoas, levando a vida em frente. Vai doer, sem dúvida. Ninguém em sã consciência opta tranqüilamente por encerrar aquilo que ilusoriamente considerava tão bom. Mas o que faz a gente sofrer tanto, ainda que seja por um segundo, não é bom de verdade. No caso de optar por esquecer, uma coisa é líquida e certa: o sofrimento é grande, mas um dia passa.

Mas é claro que o mundo não é totalmente cinza. Há que se considerar que muitos relacionamentos, tanto reais quanto virtuais permanecem, porque há inúmeras afinidades e existe um bem-querer verdadeiro. Assim, mesmo com eventuais sumiços, podem ser reatados e até mesmo vividos mais satisfatoriamente depois de uma experiência amarga.

O importante, sempre, é dar tempo ao tempo e se ocupar de coisas que lhe proporcionem prazer. Ficar dia e noite remoendo uma tristeza não ajuda em nada, o mundo vai continuar girando do mesmo jeitinho, nada vai mudar por causa disso. Seja qual for o desfecho, o fundamental é buscar incansavelmente ser feliz, sempre!

domingo, 20 de julho de 2008

Dependência emocional

Não sou fã de novelas e normalmente não as acompanho, não tenho muita paciência para o óbvio. Casualmente, no entanto, uma delas vem me chamando a atenção para um drama cotidiano, que está sendo retratado com perfeição. Trata-se da novela "A Favorita", da Globo, onde autor e atores estão dando um verdadeiro banho na questão da dependência emocional. Dá agonia de ver a mulher, representada pela atriz Lilian Cabral (magnífica) se submetendo a toda sorte de humilhações pelo marido, o ator Jackson Antunes, igualmente perfeito no papel.

"O valor que eu tenho, o amor que eu quero e o cuidado do qual necessito, eu própria é que preciso me dar. Não sou rainha do lar. Sou rainha de mim mesma."

Cenas de novela à parte, conheço alguns casos reais de mulheres que vivem à sombra de homens manipuladores e não se dão conta disso. Ao contrário, atribuem a fatores externos os problemas do relacionamento. Em geral culpam outras mulheres pelo comportamento lamentável dos parceiros, quase sempre espertíssimos, que propositadamente as diminuem ao ponto de fazê-las crer que estão realmente muito abaixo deles.

Nem sempre esses "ladrões emocionais" se valem de agressividade para aprisionar a outra pessoa. Muito ao contrário, por vezes se mostram apaixonados e presentes. Paralelamente, no entanto, com atos extremamente sutis e repetitivos, sugam até a última gota de sangue das parceiras. Fazem questão de que suas companheiras sintam-se mal consigo mesmas, ainda que elas estejam em situação infinitamente superior a eles no que diz respeito à capacidade profissional, formação acadêmica e diversas outras atribuições que poderiam torná-las independentes. Camuflam, com palavrinhas cuidadosamente planejadas, o desejo de vê-las sempre com a auto-estima destruída, arrastando chinelinhos pra cá e pra lá, feias, mal cuidadas, inativas, enfim, não desejadas por mais ninguém. No fundo os tiranos sabem que elas são fortes, maravilhosas e que na primeira oportunidade podem substituí-los por homens muito mais interessantes e que se garantem. Pior que isso: podem ser substituídos por nada, cumprindo-se o velho e sábio ditado "antes só do que mal acompanhada". Aliás, até hoje não vi uma única mulher que tenha se separado e ficado pior do que estava antes, muito pelo contrário.

Um bom exemplo disso é o filme Pão e Tulipas (uma versão moderna de Shirley Valentine), onde a personagem principal Rosalba, uma submissa e dedicada dona de casa conheceu a frustração ao ser esquecida pela família durante uma excursão. Sentindo-se abandonada, resolveu dar uma guinada na vida e partiu para um vôo solo. Viajou para Veneza sem marido e filhos, que passaram a viver o caos com sua ausência. Enquanto isso, Rosalba fazia novas descobertas, trabalhava, amava e surpreendia-se ao se deparar com a própria força. Depois de muita insistência, até tentou voltar ao antigo papel, mas já era tarde demais. Rosalba já havia incorporado irremediavelmente o gostinho da liberdade. Embora fictício, esse é um caso exemplar pra mim. Afinal, o valor que eu tenho, o amor que eu quero e o cuidado do qual necessito, eu própria é que preciso me dar. Não sou a rainha do lar. Sou rainha de mim mesma.

A carência afetiva extrema pode levar também ao desenvolvimento da dependência emocional em relação aos amigos (conhece alguém que não consegue dizer não nem pro colega mais chato?) e familiares, principalmente os mais próximos, como os pais e filhos. Esse é um caso muito corriqueiro em ambientes onde a mãe com um único filho é viúva ou separada. Possivelmente o rapaz terá dificuldade em desenvolver relações amorosas, devido ao risco de sair de casa e abandoná-la.

A verdade é que um dos primeiros passos para se libertar dessa dependência é combater a fascinação pela comodidade. É impossível mudar esse quadro sem alterar radicalmente diversas ações e, sobretudo, manifestar reações. Isso exige empenho cotidiano. Ser independente significa tornar-se capaz de se cuidar, de buscar a própria felicidade, de se responsabilizar pelas vitórias e, principalmente, pelas derrotas. Isso assusta, então, não é fácil. Mas e quem disse que viver é moleza?

Enfim, só são capazes de amar plenamente aqueles que se sentem livres pra escolher novamente, todos os dias, as mesmas pessoas, sem acomodamento ou medo e sem caminhar à sombra de ninguém. É preciso se sentir inteiro e não esperar ser completado por uma metade que na verdade não existe. Ninguém se pertence, a individualidade do outro é um fato intransponível, que deve ser aceito e respeitado incondicionalmente.

sábado, 12 de julho de 2008

Odeio que subestimem minha inteligência!

A convivência é uma arte, que envolve bem mais que sorrisos, atitudes politicamente corretas, festa e alegria. Conviver exige, acima de tudo, tolerância com os defeitos e vícios alheios. Tolerância com as inconstâncias, com a imprevisibilidade, com altos e baixos. Ser tolerante é perceber que as pessoas não são felizes 24 horas por dia, que elas têm problemas, que acordam de mau humor, que têm sono, se cansam às vezes, precisam de silêncio, de ficar sozinhas. E é difícil reconhecer isso nas pessoas. Mesmo sabendo que a gente também é assim. Me considero uma pessoa até bem flexível. Compreendo que por covardia há pessoas que são hipócritas e até falsas. Interpreto o falso-moralismo como mera falta de recursos intelectuais para se impor diante de padrões convenientemente estabelecidos. Entendo as neuroses, manias, atrevimentos, estupidez, inveja, pessimismo e até mesmo o oportunismo. Quem quiser agir assim comigo, fique à vontade, podemos tentar chegar a um consenso. Só não suporto e nem admito que subestimem minha inteligência.
"Cazuza que me desculpe, mas mentiras sinceras não me interessam... Raspas e restos também não."
Odeio desculpas simplórias, bobas e recorrentes. É horrível quando, apesar de evidências bem claras, a outra pessoa supõe que você não tem a mínima percepção dos fatos. Que fique bem claro, não falo de situações hipotéticas, onde a gente procura cabelo em ovo... Falo sobre coisas escancaradas, que qualquer um pode ver. O triste é que a mentira óbvia transforma automaticamente o interlocutor num perfeito idiota, ainda que seja dita com a melhor das intenções. Aguento firme uma resposta sincera, mas não suporto que subestimem minha capacidade de ver a realidade ou façam pouco caso da importância que dou às coisas. Só o que quero é ver sinceridade em coisas simples. Não espero a opinião franca, expressa e filosófica do que as pessoas pensam sobre o que faço ou deixo de fazer. Quero sinceridade ao dizer: "Olha, eu acho que seu cabelo não tá bom". Ou então, "viu, se você não se importa, hoje estou a fim de ficar na minha". Vou mais além: há casos em que o melhor é nem dizer nada, simples assim. A dúvida imposta pela omissão é menos ofensiva do que a certeza de que estou sendo tratada como uma alienada. Quer um exemplo triste de falta de sinceridade mútua? Tem um feriado chegando e bate aquela vontade de ir à praia. Aí, repentinamente e depois de milênios, você se aproxima daquele amigo que tem uma bela casa em Angra dos Reis... Sem mais nem menos, você começa a ligar, mandar e-mails, coisas que façam você parecer uma pessoa legal. Resposta que você vai ouvir quando se convidar pra casa de veraneio do cara: "Claro que você pode ir pra Angra com a gente!". Resposta que você deveria ouvir: "Fulano, a casa vai estar lotada de amigos meus, não tem mais espaço". Daí, se você for inteligente, vai sacar que a casa vai estar lotada de amigos e você , por ser um amigo da onça, não está incluído. Não seria muito melhor se ambos fossem mais objetivos? Tenho uma amiga que é ótima nisso e foi a partir do comportamento dela que passei a perceber que ser sincero é muito mais simples e menos doído do que se imagina. Podemos passar anos sem nos encontrar ou bater um papo, mas ela não titubeia em ligar e ser direta se precisar de algo. Não se justifica pelo afastamento, nem floreia a conversa, vai direto ao ponto. Por isso, sempre que nos reencontramos sem nenhum motivo especial, sei que ali tenho uma amiga de verdade, alguém que entrou na minha vida pra ficar. Que respeita a minha compreensão de que se esteve afastada, é porque teve seus motivos pra isso, entre eles, a vontade de estar com outras pessoas e não comigo em determinados momentos. Isso é absolutamente normal e acontece com todo mundo, mas poucos reconhecem. Penso que um pequeno gesto de sinceridade é o mínimo que se espera de amigos tão carinhosamente escolhidos. Então, dispenso desculpas esfarrapadas. Sou suficientemente forte pra suportar uma rejeição e seguir em frente, exercendo o direito de conviver só com quem vale a pena pra mim. Cazuza que me desculpe, mas mentiras sinceras não me interessam... Raspas e restos também não.

sexta-feira, 4 de julho de 2008

Sem tecnologia não dá!

Uma pane no serviço de transmissão de dados e acesso à Internet da Telefonica paralisou o estado de São Paulo nesta quinta-feira. Foram afetados os sistemas de grandes empresas, bancos, a maioria dos órgãos públicos e assinantes do Speedy.

Quase 24 horas sem Internet me transformaram praticamente numa eremita. De repente me senti como se estivesse numa ilha deserta, desabitada, esquecida. Nas primeiras horas, achei até um alívio. Finalmente colocaria em dia coisas que sempre ficam pra depois.

"Tudo seu lado bom e ruim. Não seria diferente em relação à tecnologia. Ao mesmo tempo em que ela facilita nossas vidas, nos torna escravos também. Mas não tem jeito, não dá pra fugir dela."

Embora tenha uma certa aversão pela cozinha, resolvi fazer um bolo. Ah, nada como um bolo bem quentinho nesse frio! Bolo de que? Queria de fubá, bem cremosinho. Cadê a receita? Está na Internet. Ok, desisto então. Não seria mesmo um passatempo divertido. Geralmente quando me atrevo a executar grandes performances culinárias me arrependo antes de chegar na metade do preparo.

Me ocorreu que uma ótima idéia seria ligar para um amigo, imaginei que assim como eu, ele também estivesse com tempo de sobra pra uma conversa. Animadamente pego o telefone, quando percebo que não anotei o número dele na agenda. Onde poderia encontrar? Num e-mail. Portanto, sem Internet, nada de papinho.

Que raiva! O tempo foi passando e a agonia aumentando. Será que nada mais funciona sem o uso da porcaria do computador?

Me dei conta que tudo seu lado bom e ruim. Não seria diferente em relação à tecnologia. Ao mesmo tempo em que ela facilita nossas vidas, nos torna escravos também. Mas não tem jeito, não dá pra fugir dela.

Até a vida doméstica se transformou com os avanços tecnológicos. Alguns refrigeradores, por exemplo, têm TVs acopladas, assim como acesso direto à Internet. Há multiprocessadores com função de liquidificador, batedeira e triturador de alimentos, tudo num único aparelho. No Japão é comum encontrar aspiradores de pó robôs que retiram a sujeira de determinado local, desviando de barreiras e dispensando o uso de sacos descartáveis. Minha máquina de lavar, além de oferecer diversos programas de lavagem, tem sensor para identificar a quantidade de água e processo de lavagem de acordo com a quantidade, tipo de tecido e sujeira da roupa. Mas ainda acho pouco... A danada não poderia bem pendurar, passar e guardar a roupa também?

A telefonia celular, então, é um capítulo à parte. Idéias geniais agregam aos aparelhos funções cada vez mais inusitadas. No Japão foi lançado um aparelho que repele mosquitos e pernilongos: os clientes baixam um arquivo sonoro com ondas inaudíveis ao ouvido humano para manter os insetos indesejáveis distantes num raio de um metro. O som é acionado ao simples toque de uma tecla. Nos Emirados Árabes uma companhia de telefonia móvel oferece um serviço que avisa a hora das orações diárias aos muçulmanos. O alerta funciona até mesmo se o usuário estiver em outro país. Haja!

Não são poucas as vezes em que me pego pensando sobre o que meu pai, um curioso e inovador contumaz, diria se visse tudo isso hoje. Ele nos deixou em 1972 e não chegou nem a ver a TV colorida. Se voltasse de repente, como iria entender que os telefones, cada vez mais minúsculos, sequer precisam de fios? E que você cozinha no microondas em recipientes de vidro ou plástico? Que há controle remoto pra todo tipo de aparelhos? Que você conversa com alguém e vê sua imagem on-line, estando a pessoa em qualquer lugar do planeta? Acho que o homem entraria em parafuso! Ou ficaria absurdamente encantado.

A verdade é que até podemos viver sem tecnologia, especialmente sem o computador. Mas sem isso somos excluídos de uma sociedade digital que se constitui e se consolida a cada dia, passando a ser, na grande maioria dos casos, uma necessidade e não um luxo. Um novo estilo de vida surgiu e isso exige comportamentos compatíveis.

Quem busca informações dinâmicas certamente é uma pessoa diferente daquela que não tem acesso a isso. Usada com equlíbrio e bom senso, a informática é atualmente a mais importante fonte de informação e desenvolvimento cognitivo. Quem não dispõe disso está em desvantagem ou, no mínimo, vive num regime de possibilidades muito limitadas.