sexta-feira, 19 de setembro de 2008

Fábrica de sonhos

Adoro curtir um bom filme, daqueles bem "cults", que pouca gente aguenta assistir sem dormir. Mas, pra espairecer legal, gosto mesmo é de um trash rasgadão.

Um filme trash não é necessariamente ruim, apenas exige um estado de espírito que permita enxergar a obra com olhos sarcásticos o suficiente pra se deixar levar pela história.

Ontem assisti "Lenda Urbana", um suspense obviamente previsível e bastante reprisado, mas muito divertido sob o ponto de vista analítico. O final da história é estarrecedor. Não pelo fator surpresa, ao contrário. É que o óbvio chega a ser tão escancaradamente ululante, que me deixa boaquiaberta.

No exato instante em que a vilã (melhor "amiga" da mocinha, que não sabia da trairagem da outra, lógico) ía dar o golpe de misericórdia no casalzinho sobrevivente a uma série de assassinatos, a policial que tentou matá-la sem sucesso e levou uma azeitona na barriga por causa dessa incompetência, antes do provável último suspiro, manda um tiro que acerta no braço da malvada. Esta, por sua vez, mais malvada ainda depois de tomar o pipoco, parte furiosa pra cima do casalzinho, que inadvertidamente não aproveitou essa confusão pra evaporar dali. A mocinha, num ímpeto tardio de agilidade, se apodera da arma que estava no chão e manda um balaço no peito da malévola, que, com o impacto, é jogada janela abaixo e se estatela no chão. Mal sabia o casal apaixonado que a vilã era de borracha... Depois de um longo beijo (!!!), já dentro do carro e fazendo planos para o futuro, são atacados pela doida que estava no banco de trás (the big surprise!). E a mulher tava com tudo! Tiro no braço, rombo no peito, fraturas múltiplas pela queda, tudo bobagem. Finalmente, após a ação calculada com exatidão pelo mocinho em questão de segundos, a diabólica é arremessada pelo vidro do carro e vai direto pro rio, onde comprovadamente é dada como morta por estar boiando. E não é que no final, depois de passados alguns anos, a mesma maluca aparece de novo? E dá-lhe Lenda Urbana 2, 3, 4... 549.

Aí fiquei pensando que em Hollywood as regras foram feitas pra ser quebradas. Olha só:

. Quando um vilão aparece morto, NUNCA ESTÁ. Mas não se preocupe, porque o herói sempre verá quando ele está chegando - mesmo estando de costas. E ainda que não o veja, ao ser supreendido pela morte eminente, contará com o auxílio decisivo da mocinha ou do coadjuvante feio e bobão, que irão acabar com a raça do malvado;

. O telefone toca. O herói/mocinha atende. "Aló. Sim. Ok. Obrigado." (tempo total da conversa: 5 segundos; e sem tchau, porque nos filmes ninguém se despede nunca). Em seguida, o herói/mocinha se vira para o coadjuvante: "Era Backer. Ele disse que Kate foi para o escritório há mais ou menos uma hora. Ela já deveria estar lá agora. Ele ligou pra lá, mas ela não está. Ele também ligou para John e ele ainda não a viu. Você sabe como a Kate é difícil. Ele disse que se não conseguir encontrá-la, vai chamar a polícia. É melhor irmos pra lá, rápido!" (aliás, às avessas, isso me lembra do meu irmão... Depois de passar uma hora falando com alguém, quando a gente pergunta "E aí, o que ele disse?", o espírito de porco responde ultra-sinteticamente: "Ué, nada!". Ai, ai, ai, ai-ai!);

. O modo mais eficiente de salvar uma vítima de parada cardíaca (bem melhor que o uso de desfibrilador) é gritar coisas como "Você nunca desistiu de nada na sua vida, Carol! Agora lute, LUTE!" ou "Não faça isso comigo, Carol. Eu te amo, droga!" (quase sempre isso dá um excelente resultado, o SAMU deveria adotar essa medida prática e eficiente com urgência. Opa... Peralá! Só que tem um médico que não estará autorizado a usar a segunda alternativa do método "jamé", a patroa aqui não permite);

. Quando estrangeiros (especialmente latinos) aparecem nos filmes americanos, falam inglês perfeitamente, mas NUNCA aprendem a falar sir ou thank you... Dizem señor e gracias;

. Toda fechadura pode ser aberta por um cartão de crédito ou por um clipe de papel. E os cofres dos maiores bancos do mundo são vulneráveis a qualquer gatuno com estetoscópio;

. Uma pessoa atingida por um tiro morre sempre na hora. O corpo nunca sofre com músculos se contraindo involuntariamente, enquanto o cérebro sofre morte lenta por falta de oxigenação. Vê lá se o Keanu Reeves ou o Brad Pit vão passar por um perrengue desses! Os lindérrimos jamais vão aparecer de língua pra fora, babando e fazendo annnhajjajaaammmarr... rhhrhuurhhuuhhhmm... Não rola;

. Elevadores de filmes sempre estão prontinhos no térreo ou chegam no exato instante em que a conversa termina. A não ser quando alguém está sendo perseguido, aí o jeito é ir pelas escadas, em geral abertas, pra que o perseguidor tenha boa visão do perseguido (que de minuto em minuto sempre dá uma paradinha pra olhar pra trás);

. Toda mãe de filme prepara um gostoso café da manhã com ovos, bacon, torradas e tudo mais. A família, porém, sempre passa correndo pela mesa, com tempo apenas para tomar um gole de café ou suco (deve sobrar muita comida em Hollywood! Mas isso também acontece nas nossas novelas... Ainda bem que aqui a gente é pobre e tudo é cenográfico, daí não sobra nadinha. A mesma maçã que passou pela "Favorita", roda pelo "Porra... ui! Zorra Total" e cai nas mãos da "Turma do Didi");

. Garotos de 8 a 10 anos de idade são os melhores hackers do mundo... se usarem óculos;

. As garotas que nunca conseguem pares para o baile de formatura ficam sobrando por causa da feiura (feiura = óculos + cabelo preso). Revoltadas, resolvem ficar gatíssimas e passam por uma transformação radical no visual: começam a usar lentes de contato e soltam os cabelos. Finalmente maravilhosas, acabam sempre eleitas como rainhas do baile e nos braços do gostosão da história;

. Pra terminar, após uma perseguição a pé ou de carro, das lutas com os capangas, dos sucessivos salvamentos à mocinha à beira da morte, da demorada e desgastante batalha com o vilão, depois da explosão do QG do mal, com as roupas rotas e rasgadas, cheio de cortes e toda sorte de ferimentos pelo corpo, o herói, mesmo sapecado, sempre faz uma piadinha e diz pra mocinha: "Querida, você não vai à festa com essa roupa, vai?". Um sorriso Colgate, um longo beijo e the end. Ufa! Que ânimo invejável!

Definitivamente estou ficando velha, chata e realista demais.

quinta-feira, 18 de setembro de 2008

Coitado do português!

“Boa tarde meus cameramen maravilhoso”, “Olha só, minhas bonitinha de casa”, “As féria das criançada tá acabando”, "Essa é uma das receita que as amiguinha manda pra mim fazer"… Dou um doce pro espertinho que adivinhar quem massacra nosso pobre português desse jeito. Sim, ela mesma, a impagável Palmirinha Onofre, culinarista que está no ar diariamente na TV Gazeta. Palmira é a maior engolidora de "s" que conheço. É também uma simpática senhora, que tem um jeito muito alegre e meio atrapalhado de ensinar suas receitas. Que faz do seu programa uma extensão da casa da gente, com uma simplicidade aconchegante e muito divertida.
"O que pensar de alguém que não consegue dominar nem o próprio idioma? Ainda que o trabalho não exija redação constante, pelo menos um bilhetinho a criatura manda de vez em quando, né?"
É meio complicado achar legal ver na TV alguém falando tão errado, principalmente quando se trata de um veículo com tamanha responsabilidade social. Mas a simpática culinarista representa um típico caso em que os erros são sublimados por características regionais e outras implicações culturais. Quem vai exigir da Palmirinha, uma senhora interiorana de 77 anos, que passe a utilizar um português impecável? No caso dela, inclusive, isso já virou uma marca registrada. Há, porém, casos imperdoáveis, especialmente quando partem de pessoas que têm o compromisso de se comunicar dentro da mais absoluta correção. Pior ainda quando o erro é cometido simplesmente por preguiça de fazer direito. Veja estes exemplos e depois me diga se não são de doer (observe que nos dois casos a palavra é repetida, uma vez com o jeitinho hediondo e outra do jeito correto): Não sou dona da verdade e também cometo muitos erros. Mas tento, na medida do possível, me sintonizar bem com nosso idioma, que é complicadinho de verdade, reconheço. Só não aguento quando acontece uma coisa assim: - Olha, a gente vamos aí amanhã, tá? - Não é "a gente vamos"... É "a gente vai". - Ah, você entendeu, não entendeu? Então pronto. Ninguém é obrigado a ser perfeito, todos erramos, mas o duro é errar de propósito e achar que não há problema algum nisso. Uma coisa é ser simples, como a Palmirinha e tantas outras pessoas que vemos por aí. Outra bem diferente é ser ignorante porque se quer. E não é bonito ser burro. No mundo virtual, então, meu Deus! Estão assassinando o português a tecladas, tem coisas de sangrar os olhos. O uso do cedilha, por exemplo, se tornou livre, leve e solto. A regrinha básica de que não se usa jamais o cedilha em "c" que precede as letras "e" e "i" foi abolida. Daí o festival horrendo de "voçê", "mereçe" e outras barbaridades. Hoje mesmo vi no Orkut esse recadinho de "arder os zóio", escrito por uma suposta professora prestes a se aposentar (copiado e colado ipsis litteris): "Sempre decidi voto no 45. mais meus filhos vota nno 40 o que vale é o klebe não ganha pois não dependo de prefeitura sou efetiva e ja estou me aposentando o na que vem pra vc que não sabe. xau e não se encomode com minha vidapois dela cuido EU." Credo, credo, credo! Pendure as chuteiras mesmo, filha... E já vai tarde! Essa falta de discernimento atrapalha bastante até na hora de fazer uma pesquisa na Internet. Outro dia uma pessoa queria encontrar uma determinada empresa de limpeza urbana. Sugeri uma busca no Google. Após diversas tentativas, a pessoa diz que não tem. Como assim??? A anta estava digitando "limpesa"!!! Fico espantada ao ver erros gritantes cometidos por gente com formação acadêmica suficiente pra escrever de um jeito mais decente. Tenho uma amiga muito querida, advogada, que escreve absurdamente errado. Se a gente parar pra pensar que o único instrumento de trabalho do advogado é a palavra, então isso se torna imperdoável e péssimo pra imagem do profissional. Inclusive, na minha opinião, esse exemplo derruba a tese de que só escreve bem quem lê bastante. Afinal, no curso de direito o aluno não faz outra coisa, senão ler alucinadamente. Já vi erros cabeludos cometidos por médicos, engenheiros e outros profissionais com formação superior. É a velha mania de achar que se a comunicação escrita não for fundamental pra realização do trabalho, então torna-se dispensável o uso de regras ortográficas. Caramba, quem é respeitado se não consegue se comunicar bem, seja da forma que for? E o que pensar de alguém que não consegue dominar nem o próprio idioma? Ainda que o trabalho não exija redação constante, pelo menos um bilhetinho a criatura manda de vez em quando, né? Enfim, acho que não precisamos deixar a língua portuguesa complicar a rotina, mas hoje em dia tudo fica muito mais simples quando se tem acesso à informação online. Esclarecer dúvidas de acordo com as necessidades é moleza. Além de um montão de sites disponíveis, dois que acho bem legais são Mundo Vestibular e Priberam, com excelentes dicas de ortografia, acentuação, pontuação etc. Não custa nada dispensar uns minutinhos e usar, né?

terça-feira, 16 de setembro de 2008

Frase feita 2 - Alguns absurdos

Depois da postagem de ontem percebi que falar sobre frases feitas gera boas discussões, o assunto é extenso. E se torna até polêmico quando observamos o que é ou não "politicamente correto".

Um exemplo legal de polêmica é a tal cartilha "Politicamente Correto", lançada recentemente pelo governo. Irrelevante e com o jeitão autoritário que caracteriza o atual governo, a cartilha foi elaborada pelo professor Antonio Carlos de Queiroz, da Universidade de Brasília, a pedido da Secretaria Especial dos Direitos Humanos. Trata-se de uma lista com 96 expressões/palavras consideradas pejorativas pelo autor e que devem ser evitadas pelo povo. Como a publicação causou uma controvérsia gigantesca, teve sua distribuição suspensa e deverá passar por uma revisão sistemática.

De tão absurda, na minha opinião nem deveria ser revista. Por mim iria diretamente pro lixo. Olha só alguns exemplos das "pérolas":

Para designar um motorista inábil é desaconselhado o uso da palavra "barbeiro", porque isso pode ofender o profissional do ramo. Então vamos chamar quem nos dá uma bela fechada de quê? Bom, sinceramente hoje em dia acho que "barbeiro" seria até uma gentileza. A maioria manda logo um f.d.piiiiiiiiiiiiiiii... Aí a coisa piora muito, já que a ofendida passa ser a mãe do braço duro.

Outra coisa que não se deve falar é "palhaço". Esta sim é uma classe tremendamente injustiçada. Como se não bastassem as tortas de chantilly na cara, pauladas, flores que soltam água e toda sorte de agressões no palco, eles ainda têm que tolerar o uso desapropriado de seus títulos, exaustivamente associados às pessoas de pouca seriedade. Mas para a felicidade geral dessa turma tão massacrada, a cartilha veio pra acabar de vez com a palhaçada, ou melhor, com essa injustiça.

Condenável também será dizer "farinha do mesmo saco", colocando toda sorte de indivíduos sob a mesma condição de contraventores. Afinal, quem vai se ofender com essa expressão? A farinha? O saco???

Fico aqui só pensando como ser politicamente correta quando quiser usar alguns outros termos, sem ter que enfrentar um xilindró bravo. Prevenida, já tô preparando minha lista, olha só:

GORDO - pessoa com imagem horizontalmente avantajada

ANÃO - pessoa verticalmente reduzida

POBRE - sujeito monetariamente comprometido

MULHER DA VIDA - senhora de conduta duvidosa

CARECA - indivíduo de volume capilar deficiente

Cartilha à parte, também quero comentar um pouco sobre expressões bem batidas, que são usadas de maneira absurdamente incorreta. Uma delas é "correr atrás do prejuízo", pra designar a necessidade de recuperar o tempo perdido por algo. Caramba, do prejuízo eu quero é distância. Corro atrás do lucro, isso sim.

Outra bem comum é "ir de encontro". Quem vai de encontro se choca com o objetivo ao invés de se aproximar dele. Correto é dizer "ir ao encontro".

Uma que não tem conclusão é "correr risco de morte". Há quem defenda que essa é a forma correta, já que não se corre "risco de vida", o risco está em morrer. Por outro lado, não correr risco de vida pode significar não estar com a vida ameaçada. Essa depende da interpretação de cada um, né? Sei lá eu!

Dizem que a dúvida em relação à expressão acima é pura questão de lógica. Bem, nesse caso, se a gente for tomar a lógica ao pé da letra, então um inseticida ótimo pra barata deveria deixar a bichinha toda pimpona, alegre e saltitante, ao invés de arrasar com a pobrezinha, né?

Fora tudo isso junto, tem ainda um montão de erros bem grosseiros sobre os quais gostaria falar também. Mas isso fica pra outra hora. E vamos em frente porque atrás (ui!) vem gente!

segunda-feira, 15 de setembro de 2008

Frase feita é um saco!

Aproveitando minha onda de insatisfação da semana passada, vou descer o sarrafo numa coisa que considero insuportável: o uso de clichês. Caramba, tem coisa que me deixa muito de saco cheio, que só ouço porque é melhor que ser surda (coisa mais clichê essa!).

Não falo sobre frases célebres, pensamentos que valem a pena conhecer ou relembrar. Creio que até há muito de útil nisso. Me refiro às frases ou expressões de efeito, coisinhas da moda, que invariavelmente soam irritantes pra mim.

Por impessoalidade ou pela simples falta de imaginação, o povo vive lançando mão de frases feitas, daquelas que quem diz finge que está preocupado (ou que inventou a roda) e quem ouve faz de conta que levou em conta. No fim, se nada tivesse sido dito, ficaria tudo do mesmíssimo tamanho. E dá-lhe hipocrisia e repetição.

Morreu um ente querido seu. Antes, durante e depois do velório, todo mundo batendo na mesma tecla: "Seja forte. Agora ele/a está num lugar melhor". Lugar melhor é? Sei. Então que tal mandar sua mãe pra lá ao invés da minha? Sou legal e passo a vez com todo prazer.

Outra frase batidíssima é a tal "não repare na bagunça". Olha, depois do aviso, até o sujeito mais incauto vai perceber que a coisa tá feia. Calcinha no registro do banheiro, pipocas centenárias nas dobrinhas do sofá, tênis imundo no meio da sala... Não tem jeito não, melhor calar a boca e tratar de desviar a atenção do visitante rapidinho.

Uma que me deixa fula: "Natação é o esporte mais completo". Aí tento argumentar que pode até ser, mas não queima tanta caloria quanto se imagina, afinal conheço gente que nada diariamente e é gorda. Adianta? Não. Na seqüência, roboticamente, nego manda: "Natação é o esporte mais completo". Mas é que... "Natação é o esporte mais completo". Eu só queria fal... "Natação é o esporte mais completo". Ah, deixa pra lá!

E essa: "Quem ri por último, ri melhor"? Bem coisa de despeitado. Será que depois do "toco" vai rir a plenos pulmões?

Bem, até aqui falei apenas sobre os velhos chavões que jamais são descartados. Mas tem ainda os atuais, como "releitura", por exemplo. Agora tudo virou releitura. O estilista queridinho da Caras criou um vestido horrendo, cheio de estampas coloridíssimas e de mau gosto? Releitura dos anos 70. A Globo regravou uma história mais que batida pra próxima novela? Releitura de um clássico da TV. E o abominável "um beijo no seu coração"? Caraca, isso não é poético, é nojento! Fora os tais "com certeza", "fala sério", "pede pra sair" e um bem fresquinho, que me arrebenta os tímpanos: "tô pagaaaanu!". Socorro, não dá não!

Vivemos numa época em que são pouquíssimas as idéias ou formas de expressão realmente inovadoras, que nos tragam uma compreensão inédita. Hoje busca-se a garantia de um conteúdo mínimo num discurso qualquer e repete-se à exaustão termos que não passam de "muletas" pra preguiçosos, um apoio àqueles que têm pouca disposição pra se lançar em experiências ou simplesmente pra pensar.

Acho que essa falta de recursos na comunicação interpessoal deve-se unicamente ao desprezo por um hábito salutar e indispensável, que torna qualquer zé mané num ser minimamente pensante e original de fato: leitura.

domingo, 14 de setembro de 2008

Já deu!

Tô de volta. E cansada de novo. Sabe do que cansei agora? De ficar cansada de tanta coisa. Já é hora de sacudir essa poeira e resolver de vez o babado. Porque se continuar assim vou é acabar me enchendo de rugas e mais rugas. Ficando com ar de gente brava, ou melhor, amarga. E não quero ter cara de amarga, aliás nem gosto de nada amargo, meu paladar não aceita, não consigo engolir (sério mesmo, não é nem no sentido figurado, que ainda nem tô pra muito devaneio não). Como eu previa, quem tem me deixado tão triste e desanimada sou eu. Ando brigando comigo mesma, pode um negócio desses? Pode. E deve. Não dizem por aí que a gente só briga com quem ama? Ufa, finalmente me flagro me amando de verdade, não só pra exibir uma pseudo-auto-estima perfeita. Por isso ando me catando pelos cabelos. Melhor que ser indiferente, já chega ter que aturar isso de outras pessoas.

Vou parar de me sacanear e botar em prática o que meus sentimentos mandam. Vou juntar meus pedaços e encarar meus monstros, com medo sim, mas determinada. Sabe o que vou falar, de bocona bem cheia? DAAAAAAAAANE-SE! Isso pra não dizer aquela outra coisa (ainda mais eficiente e certeira), que sou mocinha de fino trato.

Quando minha psicóloga der uma olhadinha nisso aqui vai ficar toda toda. Afinal, há anos ela vem me alertando sobre o epicentro do meu terremoto pessoal, sobre a grande sabotadora de mim mesma, ou seja, euzinha aqui. Só que como toda teimosa incorrigível, faço o quê? Boto a culpa nos outros. Em tudo. No tempo, na falta de tempo, na rotina, na falta dela, em gente mentirosa, em gente sincera demais... Já deu, né? Chega de ilusão. Parece loucura, mas a ilusão pode se tornar uma dependência com resultado tão nefasto, que a gente, sem perceber, se mete em enrascadas só pelo prazer da desilusão. São dois vícios que se complementam: o prazer de estar nas nuvens e a dor de cair, se esborrachando no chão. É por isso que cabeças-duras como eu ficam só na promessa, vivem o tempo todo entre o real e o imaginário, cometendo sempre os mesmos erros. Como Deus é um cara gozador e adora uma farra, vive testando minha capacidade de me emendar e manda pro meu lado uma confusão pior que a outra, de diversos tipos. E fica lá, se arrebentando de rir, porque sabe que eu sempre me estrepo. Toda vez é assim. Ao menor sinal de uma nova frustração digo energicamente a mim mesma: "Melhor sair dessa já! Tu é safa, não caia mais nessa conversa!"...

Hum... Você acha que eu faço isso? Acha? Beeeeeeem, é claro que... Não! NÃO FAÇO!!! Toma, burralda!

O jeito, então, é me catar a unha pra ver se aprendo de uma vez. É levantar as mãos aos céus e agradecer por cair do pedestal de novo e de novo, porque só assim faço a opção entre lutar ou ser engolida. O mundo não é um faz-de-conta e não adianta me esconder, porque a realidade, maior inimiga da ilusão, acaba me encontrando onde quer que eu esteja. E sem dó nem piedade vai berrar na minha orelha: "ACORDA, CRIATURA!".

Ai, ai, dona realidade!... Não precisa gritar, tá? Já acordei! Cáspita, vou ser sincera, vai... Ainda tô espreguiçando. Mas já já tô ligadona, viu? Prometo!

quinta-feira, 11 de setembro de 2008

Deixando ir...

Ainda não estou muito animada, mas a cada dia sinto reforçada a idéia de que é fundamental me livrar do que não serve mais para a minha vida. Percebi que não há uma razão específica pra essa marcha lenta em que me encontro no momento. Vejo que trata-se apenas da necessidade de reciclar diversas coisas e aceitar novos desafios. Certa vez ouvi alguém dizendo uma coisa que jamais esqueci e que tomo como base quando me sinto assim tão mal: se não jogar fora o que é velho, nunca haverá espaço para o novo. Então é isso, aos poucos vou deixando meus pássaros voarem livremente e, devargazinho, me torno mais leve, logo poderei voar de novo também. Este magnífico texto de Fernando Pessoa define perfeitamente a necessidade de deixar ir:

"Sempre é preciso saber quando uma etapa chega ao final... Se insistirmos em permanecer nela mais do que o tempo necessário, perdemos a alegria e o sentido das outras etapas que precisamos viver.

Encerrando ciclos, fechando portas, terminando capítulos. Não importa o nome que damos, o que importa é deixar no passado os momentos da vida que já se acabaram.

Foi despedida do trabalho? Terminou uma relação? Deixou a casa dos pais? Partiu para viver em outro país? A amizade tão longamente cultivada desapareceu sem explicações?

Você pode passar muito tempo se perguntando por que isso aconteceu.... Pode dizer para si mesmo que não dará mais um passo enquanto não entender as razões que levaram certas coisas, que eram tão importantes e sólidas em sua vida, serem subitamente transformadas em pó. Mas tal atitude será um desgaste imenso para todos: seus pais, seus amigos, seus filhos, seus irmãos, todos estarão encerrando capítulos, virando a folha, seguindo adiante, e todos sofrerão ao ver que você está parado.

Ninguém pode estar ao mesmo tempo no presente e no passado, nem mesmo quando tentamos entender as coisas que acontecem conosco.

O que passou não voltará: não podemos ser eternamente meninos, adolescentes tardios, filhos que se sentem culpados ou rancorosos com os pais, amantes que revivem noite e dia uma ligação com quem já foi embora e não tem a menor intenção de voltar.

As coisas passam, e o melhor que fazemos é deixar que elas realmente possam ir embora... Por isso é tão importante (por mais doloroso que seja!) destruir recordações, mudar de casa, dar muitas coisas para orfanatos, vender ou doar os livros que tem.

Tudo neste mundo visível é uma manifestação do mundo invisível, do que está acontecendo em nosso coração... e o desfazer-se de certas lembranças significa também abrir espaço para que outras tomem o seu lugar. Deixar ir embora. Soltar. Desprender-se.

Ninguém está jogando nesta vida com cartas marcadas, portanto às vezes ganhamos, e às vezes perdemos.

Não espere que devolvam algo, não espere que reconheçam seu esforço, que descubram seu gênio, que entendam seu amor. Pare de ligar sua televisão emocional e assistir sempre ao mesmo programa, que mostra como você sofreu com determinada perda: isso o estará apenas envenenando, e nada mais.

Não há nada mais perigoso que rompimentos amorosos que não são aceitos, promessas de emprego que não têm data marcada para começar, decisões que sempre são adiadas em nome do "momento ideal".

Antes de começar um capítulo novo, é preciso terminar o antigo: diga a si mesmo que o que passou, jamais voltará!

Lembre-se de que houve uma época em que podia viver sem aquilo, sem aquela pessoa - nada é insubstituível, um hábito não é uma necessidade. Pode parecer óbvio, pode mesmo ser difícil, mas é muito importante. Encerrando ciclos. Não por causa do orgulho, por incapacidade, ou por soberba, mas porque simplesmente aquilo já não se encaixa mais na sua vida.

Feche a porta, mude o disco, limpe a casa, sacuda a poeira. Deixe de ser quem era, e se transforme em quem é. Torna-te uma pessoa melhor e assegura-te de que sabes bem quem és tu próprio, antes de conheceres alguém e de esperares que ele veja quem tu és..

E lembra-te : tudo o que chega, chega sempre por alguma razão."

Com absurda ousadia, complemento o texto de Fernando Pessoa: e tudo o que vai, também vai por alguma razão... Algum dia, com certeza, a gente acaba entendendo qual foi.

domingo, 7 de setembro de 2008

Vai passar...

É incrível como há pessoas que conseguem enxergar a alma da gente, sem nem ao menos nos conhecer. Ontem estava na loja de uma amiga e quando me aproximei do balcão, uma senhora olhou pra mim e disse à balconista: "Ela está sorrindo, mas tem olhos tristes". É verdade, querida senhora. Estou triste. Mas como bem colocou Clarice Lispector, eu não sou tão triste assim, é que hoje eu estou cansada. Cansei, cansei, cansei. Cansei de agora, cansei de antes, cansei de tudo. Cansei de mim, estou triste comigo mesma.

Porque me olho no espelho e não me vejo. Porque não tenho cuidado de mim como deveria, não tenho me dado o carinho e a atenção que mereço. Não tenho me dedicado o tempo necessário pra desfazer o emaranhado de incertezas que enfiei na cabeça. Porque tenho sido tão "politicamente correta" o tempo todo, tanto que escrevo aqui para os outros e esqueço de mim. Hoje vou fazer diferente. Essa postagem é minha, falarei pra mim mesma, estou precisando me ouvir um pouco mais.

Vou dizer a mim que quero por perto só quem não tenha medo de falar o que pensa, que goste da minha companhia, das minhas opiniões, que me dê suas próprias opiniões e que, de preferência, até discorde de mim, que é pra que eu possa exercitar o que faço melhor: argumentar, advogar em minha própria causa. Até dou o braço a torcer, mas gosto de uma boa briga.

Que quero gente pra me dizer "já passou" quando sinto medo, porque medo todo mundo tem. Só que não quero ter medo de me envolver com as pessoas que entram na minha vida meio sem querer, mas sempre porque eu quero. E que preciso entender, definitivamente, que nem tudo será exatamente como eu gostaria que fosse, que cair dói, levantar é difícil, mas sempre é possível.

Que cansei de ser "especial" pra algumas pessoas... Outro dia estava vendo um desenho animado onde a mãe explicava ao filho que todo mundo é especial, cada um à sua maneira, ao que o filho responde: "Dizer que todo mundo é especial é só mais uma maneira de dizer que ninguém o é". Pois é, é isso. Não quero e nem preciso ser "especial" pra ninguém. Quero ser eu mesma, simples assim. E receber em troca sentimentos também bem simples, mas absolutamente sinceros. E só.

Acima de tudo quero me dizer que essa tristeza vai passar. Que ao contar com a companhia de amigos com quem possa chorar ou dar risada, passará rápido. Que ao voltar a sentir o calor do sol e o cheiro do mar (que tanto está me fazendo falta), passará ainda mais rápido, rápido, rápido.

O bom de ter mais de 40 e não a metade é a certeza da continuidade pós-frustrações. Saber da garantia de que se a alegria passou, a tristeza vai passar também. Se não for por um golpe de sorte, será por esforço e merecimento. E, se demorar muito, ainda que seja só por instinto ou sobrevivência, vai passar, é claro que vai. Sempre passa.