quarta-feira, 21 de janeiro de 2009

Carinho dispensa palavras

Há poucos dias atrás um amigo me surpreendeu com uma frase que me fez refletir bastante. Depois de ouvir minha reclamação por sua ausência, ele disse: "Nossa proximidade se dá muito além das palavras... Nos encontramos em pensamentos, situações do dia-a-dia, num filme, numa música, nas lembranças". Ele tem toda razão. Geralmente damos pouco ou nenhum valor a pequenos gestos, coisas simples que se fazem presentes o tempo todo e estão muito acima de palavras ou atitudes convencionais.  

Isso me remeteu a um fato que demorei quase que a vida toda para compreender: não me lembro de jamais ter recebido um beijo ou abraço de minha mãe. Nunca ouvi um elogio seu, nem palavras doces. Parece monstruoso, inimaginável até, que uma mãe não sinta vontade de sentir o filho mais perto e deixe de demonstrar seu afeto através da aproximação física ou de palavras carinhosas. Mas, a duras penas, finalmente compreendi que há várias formas de carinho, basta que a gente as observe com muita atenção. Minha mãe trocava os beijos e abraços por quitutes deliciosos, que fazia continuamente e com a maior dedicação. Sua alegria estava em ver como todos saboreavam avidamente as delícias que preparava e, assim, afagava os filhos com um carinho que era só seu, que só ela sabia dar. Essa era a única maneira que ela encontrava de transpor a barreira criada por sua enorme dificuldade em demonstrar o amor que sentia por nós, provado exaustivamente com outros inúmeros gestos de dedicação e renúncia até. Mais que os beijos ou abraços que não vieram, ficaram as doces lembranças que aguçam meus sentidos e sempre a trazem pra junto de mim. Toda vez que sinto o cheiro e o sabor de algo que ela preparava, pronto... Me sinto acariciada e segura com sua presença mais uma vez. 

Há pessoas que deixam marcas eternas na gente, simplesmente permitindo que seus gestos falem por si e que as palavras não ditas se revelem em suas atitudes. Criam verdadeiras poesias sem usar uma palavra sequer. Pequenos gestos fazem toda a diferença. Sair, na hora de uma briga, para dizer, sem palavras, que não quer brigar. Ir embora de um lugar onde se está sendo desrespeitado para dizer, sem palavras, que você merece respeito. Enfim, em coisas bem rotineiras a gente vai aprendendo como em muitas ocasiões é sábio cultivar o silêncio e demonstrar apenas através de gestos o que sentimos verdadeiramente.

Tenho percebido cada vez mais a importância de observar nos outros os sentimentos que estão impressos em seus gestos. De enxergar além, de ver o que passa despercebido. De encontrar carinho num prato preparado com dedicação, numa música que se partilha ainda que indiretamente, numa flor cultivada com cuidado, no trabalho exaustivo de alguém que se ausenta pensando sempre no bem-estar de quem fica. 

Costumo afirmar ao mesmo amigo que me disse a frase lá de cima que não mando recado a ninguém pelo blog. Mas hoje quero que ele considere que esta postagem é dirigida também a ele, que me ajudou a refletir mais uma vez sobre coisas que realmente importam. E deixo aqui dois pensamentos que traduzem com perfeição tudo o que eu disse antes: "Se você não consegue entender o meu silêncio, de nada adiantarão as palavras, pois é no silêncio das minhas palavras que estão todos os meus maiores sentimentos." (Oscar Wilde) "Falar é completamente fácil, quando se tem palavras em mente que expressem nossa opinião. Difícil é expressar por gestos e atitudes o que realmente queremos dizer e o quanto queremos dizer, antes que o outro se vá." (Carlos Drummond de Andrade)

quinta-feira, 8 de janeiro de 2009

Entre você ou o outro se aborrecer, qual é sua escolha?

O ano nem bem começou e dúvidas assombram muitas cabeças, inclusive a minha. Tenho recebido muitos e-mails de pessoas insatisfeitas com seus próprios posicionamentos diante de certas situações ou pessoas, um problema bem frequente pra mim também. Ando numa fase bem "Hamlet", meio sem rumo, por isso não sei se posso acrescentar algo pra alguém nesse momento, mas vou tentar. Até porque, assim, estarei colocando em prática um exercício terapêutico bem legal e que recomendo aos que, como eu, andam à procura de algumas respostas. Me foi recomendado expressar, por meio de textos ou desenhos, situações reais de conforto e desconforto pra mim. Como gosto de me atirar de cabeça nas experiências, estou tratando de fazer logo as duas coisas. Hoje ilustrei uma situação de grande prazer pra mim, minha reunião semanal com as amigas, que aliás me alivia muito nessas horas de sufoco: A grande dificuldade que encontrei em comum entre minhas dúvidas e as daqueles que me escrevem é a insistência em ignorar o tênue limite que há entre agradar os outros e agradar a si mesmo. Buscar esse equilíbrio é fundamental, é preciso saber ceder e se impor simultaneamente, num ritmo saudável e evolutivo. Quando apenas um cede, só um se dá, um só provém e o outro apenas usufrui, a relação fica extremamente insatisfatória e desgastante. Mas é muito importante destacar que não há culpados ou inocentes, já que ambos aceitam o lugar ocupado e agem de modo a reforçá-lo. É bem possível, então, que ao tentar agradar o outro ou preservar uma dinâmica anterior que tenha sido agradável, a gente acabe por desconsiderar nossos próprios desejos e insista em apenas agradar a outra pessoa, sem exigir a necessária reciprocidade. Um relacionamento bom de verdade pressupõe interação e aí não cabe individualismo. Reciprocidade significa troca, é dar-se ao outro e receber dele também. Para tanto, depois de reconhecer o prazer de estar com a outra pessoa e admirá-la, é fundamental que se faça o mesmo por você: conhecer-se, interessar-se por si mesmo, apaixonar-se por sua singularidade. Caso contrário, cederá todo o espaço para que o outro ocupe, restando para você, inevitavelmente, o lugar de vítima. Aí, pronto: está instalada a dinâmica doentia da insatisfação. Todo mundo pode (e deve, em determinados casos) ceder e deixar que as vontades do outro prevaleça. Mas precisa perceber, definitivamente, que existe uma enorme diferença entre fazer isso de forma consciente, com bom senso e justiça, e fazer somente pra receber reconhecimento em troca. E como sabiamente sempre diz minha terapeuta: entre o outro ficar chateado e você, seja egoísta e deixe a chateação pra ele. Não é politicamente correto, eu sei, mas dá um alívio danado, pode crer!