domingo, 20 de julho de 2008

Dependência emocional

Não sou fã de novelas e normalmente não as acompanho, não tenho muita paciência para o óbvio. Casualmente, no entanto, uma delas vem me chamando a atenção para um drama cotidiano, que está sendo retratado com perfeição. Trata-se da novela "A Favorita", da Globo, onde autor e atores estão dando um verdadeiro banho na questão da dependência emocional. Dá agonia de ver a mulher, representada pela atriz Lilian Cabral (magnífica) se submetendo a toda sorte de humilhações pelo marido, o ator Jackson Antunes, igualmente perfeito no papel.

"O valor que eu tenho, o amor que eu quero e o cuidado do qual necessito, eu própria é que preciso me dar. Não sou rainha do lar. Sou rainha de mim mesma."

Cenas de novela à parte, conheço alguns casos reais de mulheres que vivem à sombra de homens manipuladores e não se dão conta disso. Ao contrário, atribuem a fatores externos os problemas do relacionamento. Em geral culpam outras mulheres pelo comportamento lamentável dos parceiros, quase sempre espertíssimos, que propositadamente as diminuem ao ponto de fazê-las crer que estão realmente muito abaixo deles.

Nem sempre esses "ladrões emocionais" se valem de agressividade para aprisionar a outra pessoa. Muito ao contrário, por vezes se mostram apaixonados e presentes. Paralelamente, no entanto, com atos extremamente sutis e repetitivos, sugam até a última gota de sangue das parceiras. Fazem questão de que suas companheiras sintam-se mal consigo mesmas, ainda que elas estejam em situação infinitamente superior a eles no que diz respeito à capacidade profissional, formação acadêmica e diversas outras atribuições que poderiam torná-las independentes. Camuflam, com palavrinhas cuidadosamente planejadas, o desejo de vê-las sempre com a auto-estima destruída, arrastando chinelinhos pra cá e pra lá, feias, mal cuidadas, inativas, enfim, não desejadas por mais ninguém. No fundo os tiranos sabem que elas são fortes, maravilhosas e que na primeira oportunidade podem substituí-los por homens muito mais interessantes e que se garantem. Pior que isso: podem ser substituídos por nada, cumprindo-se o velho e sábio ditado "antes só do que mal acompanhada". Aliás, até hoje não vi uma única mulher que tenha se separado e ficado pior do que estava antes, muito pelo contrário.

Um bom exemplo disso é o filme Pão e Tulipas (uma versão moderna de Shirley Valentine), onde a personagem principal Rosalba, uma submissa e dedicada dona de casa conheceu a frustração ao ser esquecida pela família durante uma excursão. Sentindo-se abandonada, resolveu dar uma guinada na vida e partiu para um vôo solo. Viajou para Veneza sem marido e filhos, que passaram a viver o caos com sua ausência. Enquanto isso, Rosalba fazia novas descobertas, trabalhava, amava e surpreendia-se ao se deparar com a própria força. Depois de muita insistência, até tentou voltar ao antigo papel, mas já era tarde demais. Rosalba já havia incorporado irremediavelmente o gostinho da liberdade. Embora fictício, esse é um caso exemplar pra mim. Afinal, o valor que eu tenho, o amor que eu quero e o cuidado do qual necessito, eu própria é que preciso me dar. Não sou a rainha do lar. Sou rainha de mim mesma.

A carência afetiva extrema pode levar também ao desenvolvimento da dependência emocional em relação aos amigos (conhece alguém que não consegue dizer não nem pro colega mais chato?) e familiares, principalmente os mais próximos, como os pais e filhos. Esse é um caso muito corriqueiro em ambientes onde a mãe com um único filho é viúva ou separada. Possivelmente o rapaz terá dificuldade em desenvolver relações amorosas, devido ao risco de sair de casa e abandoná-la.

A verdade é que um dos primeiros passos para se libertar dessa dependência é combater a fascinação pela comodidade. É impossível mudar esse quadro sem alterar radicalmente diversas ações e, sobretudo, manifestar reações. Isso exige empenho cotidiano. Ser independente significa tornar-se capaz de se cuidar, de buscar a própria felicidade, de se responsabilizar pelas vitórias e, principalmente, pelas derrotas. Isso assusta, então, não é fácil. Mas e quem disse que viver é moleza?

Enfim, só são capazes de amar plenamente aqueles que se sentem livres pra escolher novamente, todos os dias, as mesmas pessoas, sem acomodamento ou medo e sem caminhar à sombra de ninguém. É preciso se sentir inteiro e não esperar ser completado por uma metade que na verdade não existe. Ninguém se pertence, a individualidade do outro é um fato intransponível, que deve ser aceito e respeitado incondicionalmente.

3 comentários:

  1. Dificilmente uma pessoa vai passar pela vida sem experimentar o gosto amargo da manipulação alheia, pelo menos em algum momento. A diferença está em como reagir a isso e dar outro rumo à situação. Infelizmente nem todo mundo consegue sair dessa sozinho. Bj!

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  2. Este comentário foi removido pelo autor.

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  3. Realmente tia, há muitas mulheres dependentes, e os motivos são vários, algumas não saem de casa por não serem independentes financeiramente, outras, na esperança de criar os filhos junto do marido, e existem ainda aquelas que imaginam que tudo isso é uma fase, que logo vai passar! Mas quando alguma dessas decide largar tudo, nem chega a se arrepender e até se espanta por ter tido tamanha ousadia de tentar algo novo. E essa nova vida se torna tudo que ela precisava pra se sentir viva novamente!

    Beijão tia ;*

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